Fotos: David T Silva

Que Guabiruba tem vocação para a indústria têxtil, lindas paisagens para visitar e conta com produtores locais de cachaça e cerveja não é nenhuma novidade. Mas você sabia que a cidade possui plantações de uvas e empreendedores de olho no mercado de vinhos? 

O Guabiruba Zeitung foi conhecer dois vinhedos, um deles já resulta em bebidas coloniais e o outro ainda não produziu, mas o proprietário já engarrafa os próprios vinhos com uvas compradas de outros produtores. 

Os vinhedos guabirubenses ficam no bairro Lageado Alto. Na rua que leva o nome do bisavô José Stedile, o vitivinicultor Rubens Stedile teve a ideia junto com um amigo de resgatar um pouco da cultura italiana trazida pelos anteados. “Todo bom italiano bebe vinho. Então, decidimos plantar um parreiral e ver onde ia dar”, recorda. 

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Inicialmente, em 2013, fizeram as mudas em casa e plantaram 100 pés de uva Grano d’Oro (uva tinta, clone da variante Bordô), com a ajuda da Epagri. No ano seguinte, plantaram mais 100. “Os primeiros cachinhos de uva vieram com dois anos, mas geralmente é no terceiro ano após o plantio que começa a gerar a primeira produção. Depois de sete ou oito anos, atinge o auge da produção e estabiliza”, detalha.  

Stedile conta que fez alguns cursos, buscou ideias com várias pessoas, e, como uma receita de bolo, formulou um vinho. “Eu faço o meu vinho e ele faz o dele. Usamos métodos diferentes. Faço um produto colonial, sem conservantes. Por isso, não consigo igualar a produção de vinho a cada ano. É complexo e cheio de detalhes, como: temperatura, tempo de armazenamento ou mudanças na colheita”, ressalta. 

O vitivinicultor conta que após concluir a colheita em janeiro deste ano até agora está em processo de trasfega, que é a operação de transferência do vinho de um para outro recipiente separando o vinho limpo do depósito ou borra. “Se o clima muda ele volta a fermentar. Então se engarrafar agora vai estourar a garrafa. Nos primeiros anos isso acontecia muito, meu Deus do céu”, diverte-se. 

De acordo com Stedile, o tempo de fabricação do vinho varia de acordo com o clima. “Se eu tivesse um tanque para manter uma temperatura constante, conseguiria acelerar o processo, pois em um dia frio como hoje o vinho não fermenta. Aí vem um dia de calor e ele volta a fermentar”, explica. 

Este ano, a produção do vinhedo chegou a quase uma tonelada e meia de uva. O resultado da colheita foi dividido para a elaboração de suco, vinho e venda in natura. “Na época da colheita, ou da vindima como os italianos falam, o pessoal vem aqui em casa e compra uva por quilo. Faz dois anos que comecei a vender e eles gostam, porque é sem agrotóxico”, ressalta. 

A venda do vinho também é realizada em casa e muito aguardada. Como a produção é pequena, chega a ter lista de espera para garantir uma garrafa de vinho tinto colonial, seco ou suave. 

Stedile é servidor público da Secretaria de Obras do município e o trabalho com as uvas virou uma segunda renda. Para manter em dia os cuidados com o vinhedo ele conta com a ajuda dos pais, Rosinha e Vilmar. 

Agora, por exemplo, está chegando a hora de podar as plantas. “Está na época, mas a data exata varia a cada ano. É preciso ficar atento à previsão do tempo. Ela está em dormência, então se eu podar acordo a planta, ou seja, estimulo para brotar. Se brotar e der uma geada, não tem mais uva! Vai ficar dois anos parado, sem contar o estresse da planta demonstrado na próxima safra. O meu vinho é popular, então o custo para implantar um viveiro protegido, não compensa. Para isso, eu teria que ter uvas mais finas”, afirma.   

Outra preocupação do produtor é com as abelhas. Às vezes, é preciso adiantar a colheita para aproveitar a uva sem que elas estraguem os grãos. O problema é que se colhida antes da hora, a fruta tem menos açúcar, o que prejudica a produção e a qualidade do vinho.  

Segundo Stedile, praticamente toda a produção é manual, mas com o ar dos anos ele adquiriu algumas máquinas para auxiliar no processo. Uma delas é a desengaçadeira, que separa os cachos e quebra os grãos. 

“Essa máquina já quebra o grão para poder extrair o suco na fermentação do bagaço por cinco dias. Eu envaso em um tambor com uma torneira e para arrolhar inventei uma maquinhinha a ar. Já a fermentação, é feita em tambores de propileno alimentício”, revela. 

Como ocorreu com diversas atividades, no ano ado a pandemia prejudicou a produção de vinhos. “Fiquei sem garrafas”, conta. 

Para este ano, Stedile estima vender cada garrafa de vinho por R$ 15 ou R$ 16. A produção média é de mil garrafas. “Acredito que até setembro  eu começo a engarrafar o vinho seco. O pessoal nosso aqui de Guabiruba gosta dele mais adocicado, então faço depois uma adição de açúcar, para engarrafar o vinho suave”, destaca. 

O vitivinicultor conta que produz vinho mais por amor do que pelo retorno financeiro. “Eu faço porque gosto. Do que investi, para ter retorno rápido teria que cobrar muito por uma garrafa. Faço mais por amor, e, para quem sabe, no futuro virar um negócio. Hoje eu produzo minha uva e meu vinho. É bem mais complicado do que se eu só produzisse vinho. Gosto de saber o que estou colhendo e processando, assim garanto a qualidade da matéria prima”, frisa. 

Com novas uvas plantadas, o projeto agora é se arriscar na produção de um espumante rosé. “É muito gratificante produzir uva e vinho”, resume Stedile enquanto mostra o rótulo que aplica nas garrafas com o nome “San Lorenzo – vinhos artesanais – Guabiruba”. 

“Com a minha pequena produção, já é possível afirmar que Guabiruba produz uva e produz vinho. Tudo tem um começo!”, conclui.     

Quatro vinhos para chamar de seus 

Continuando pela Estrada Geral do bairro Lageado Alto, subimos alguns metros de altitude e percebemos a temperatura alguns graus mais fria. Logo a frente está a propriedade do empresário Cledson Roberto Kormann, que atualmente é também vice-prefeito da cidade.   

Kormann já tem quatro vinhos para chamar de seus: o Graxaim Cabernet Sauvignon, o Aracuã Merlot, o Carneiro Branco Chardonnay e o Tangará, que é um corte de Merlot e Sangiovese. Os nomes e os rótulos são inspirados na fauna local de Guabiruba, onde os vinhos são produzidos, no mesmo local onde Kormann produz cerveja desde 2008. 

Diferente de Stedile, que produz vinho colonial, ele optou pela produção de vinhos com uvas finas, que compra de outros produtores. Mas recentemente também plantou um vinhedo em suas terras e aguarda o início da produção das sete variedades de uvas escolhidas: Chardonnay, Pinot Noir, Cabernet Sauvignon e Franc, Menos D’avola, Marselan e Sangiovese.  

“Tudo é novo aqui. Ainda não sabemos quais variedades vão se adaptar ao nosso clima. Estamos há quase 500 metros de altitude e a temperatura é diferente do centro da cidade, com uma variação em torno de três graus – no inverno um pouco mais. A terra, em princípio é legal, tem uma boa permeabilidade. Fico esperançoso que possa produzir boas uvas, mas só plantando mesmo para saber”, ressalta Kormann. 

De acordo com ele, este ano serão plantadas no local mais quatro variedades de uvas: duas Moscatos, Lorena e Isabel, que é uma uva de mesa.  

O empreendedor conta que quando começou a produzir cerveja já tinha vontade de    fazer vinho, mas avaliou as dificuldades, que eram maiores naquele período. 

“A dificuldade em relação à cerveja é que é preciso ter a uva fresca. Já os insumos para a cerveja, como o malte, é possível comprar de distribuidoras e armazenar por meses. Aqui na região só é produzida uva de mesa para vinho colonial, em Nova Trento e Pinheiral, por exemplo. Então, o mais próximo daqui que se tinha uva vinífera era na Serra Catarinense, em São Joaquim, Urupema e alguma coisa em Urubici. Só que tudo muito recente, de 10 anos para cá. E aí temos a região de Bento Gonçalves, no Vale dos Vinhedos, mas que é fora de mão para comprar”, explica. 

A decisão de produzir o primeiro vinho Kormann tomou há quatro anos. “Na Serra tem uma associação de cultivadores de uvas viníferas de altitude. Na época, eu comprei um pouco de uva em São Joaquim, Cabernet Sauvignon. Fiz um vinho e ficou legal! Eu já tinha intenção de talvez plantar uvas aqui em cima, mas decidi primeiro fazer o vinho para depois iniciar o plantio”, destaca. 

Um ano depois, o empresário comprou matéria prima em Urupema. “Ai fiz dois vinhos – Merlot e Chardonnay. No terceiro ano, eu fiz um Cabernet Sauvignon também e esse ano fui buscar uva no Vale dos Vinhedos, porque aqui no Estado tivemos muita chuva e a uva não atingiu a maturidade suficiente. Como no Rio Grande do Sul choveu menos, as uvas lá estavam mais interessantes”, comenta ele, que já produziu cerca de 1,5 mil garrafas de vinho, com a ajuda do amigo Anderson Deichmann. 

Segundo Kormann, a produção do vinho é feita no Gurman (pub que possui na cidade) e não envolve muita estrutura. “É um tanque de polipropileno para fermentação com temperatura controlada. No mais, é uma máquina para desengaçar”, conta.   

Ele explica que a produção ainda não é comercializada. Objetivo agora é testar, para futuramente definir se isso vai se transformar ou não em um negócio. Por enquanto, trabalha para transformar o local onde está o vinhedo em uma área temática, que vai incrementar o turismo na cidade. O empreendimento ainda não tem data de inauguração. 

“Pretendo explorar o vinhedo e os chalés que estão em construção. A intenção é ter um ambiente para o vinho, que o visitante veja o que é uma uva Chardonnay, o que é uma uma Pinot Noir, qual a diferença entre elas. O vinhedo agora é mais didático do que funcional. Eu não sei se esse Chardonnay vai vingar, mas vai dar um cacho. Vou poder mostrar isso,  mas se vai dar para produzir vinho ou não, só vou saber no futuro”, avalia.  

Em uma produção plena, o vinhedo de Kormann, que conta com 450 pés, pode resultar na colheita de uma tonelada de uvas. “É uma área pequena. Daqui alguns anos se eu perceber que uma uva se destacou ai eu posso plantar mais mudas. Uva vinífera tem que tentar, não dá para adivinhar o que vai acontecer. Na Serra Catarinense, por exemplo, uma variedade que talvez seja considerada a uva do Estado é a Sauvignon Blanc, que tem uma produção boa e de qualidade, o que é mais importante, pois um vinhedo cheio de cachos não significa boa uva para fazer vinho”, frisa. 

Agora com a agenda de compromissos mais apertada, em função das atividades do Executivo, Kormann está terceirizando o plantio, mas as primeiras mudas foram plantadas por ele e dois amigos. “As primeiras mudas eu fui buscar na divisa da Argentina de carro. Já fui chamado de louco por gastar tempo e plantar uva em Guabiruba, que não vai dar nada. Mas há alguns anos cerveja também não ia dar e deu. Como eu já produzia cerveja, acho que para mim foi mais fácil com o vinho”, acredita.  

Ele explica as diferenças na produção de vinho e cerveja. “Fazer uma receita de cerveja boa é fácil, executar é mais complicado. Já no caso do vinho, é muito fácil o processo. Se na sua casa, você amassar a uva e colocar dentro de um garrafão com a levedura e a temperatura adequada, vai sair vinho. Não tem segredo. Mas é preciso uma uva sensacional para fazer um vinho sensacional. Se a uva não for boa, esquece! O malte não, às vezes ele nem é aquilo tudo aquilo, mas bem feito fica bom”, ressalta. 

“Não sei se é a expressão correta, mas o vinho envolve mais espírito. A gente vê a uva no pé, tem que colher, tem a pressa de processar, porque não é possível armazenar muito tempo. Cerveja eles mandam o malte pelo correio e a gente guarda ali e faz quando pode”, acrescenta. 

O empreendedor conta que atualmente consome mais vinho do que cerveja. “Eu indico o consumo de bons vinhos, que têm uma série de propriedades terapêuticas. Se consumido de forma moderada, o vinho pode trazer vários benefícios para a saúde. Embora tenha um valor às vezes mais elevado, é uma bebida legal de se beber”, finaliza.  

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